sábado, fevereiro 12, 2005

A praia dos esquecidos


A noite veio beijar a areia
de uma praia algarvia.
Mal sabia,
a noite encantada, que a maresia
não traz apenas búzios e conchas mágicas.
Acompanha-a as ondas,
e com elas os ecos dos mareantes perdidos.
O mar ulula eloquente
Conta histórias de glória desta gente,
que bebe na íris dos olhos as águas turvas da aventura.
Embriagados de fantasia,
troçam da amargura,
e afogam a alma nos mares,
menos extensos e mais pesados.
E, aos pares,
com uma cadência quase precisa,
derrama-se as almas no vidro frio,
e ouvem deleitados histórias
que conhecem de fio a pavio,
com pontos e vírgulas
e alguns acrescentos,
como aquela que contam que num barco ia um,
e passadas algumas marés, iam centos.
As marés vão e vêm,
morrendo na praia sedenta dos lábios.
São sábios,
artesãos do conto,
curtidos na força das ondas,
polidos nas narrações do mar.
Afogam-se, que é essa a morte do pescador,
nas turvas águas da dor,
na saudade dos anos que não vão voltar.

Albatroz


Entre onda e onda,
volta e volta.
Entre regressos e idas
desta revolta
os ecos voam de peito aberto ao vento,
nas asas estendidas de um albatroz.
Leva no voo um lamento,
que de nós
partiu num murmúrio
e fez-se ao vento,
nele cresceu e fez-se augúrio.
Não remite.
Não vacila nem quebra.
É de nós um porto,
uma âncora,
uma amarra.
É a garra
e o gemido.
Nas asas de um albatroz depenado.